Sinais Vitais de Uma Startup: Os Verdadeiros Indicadores de Sucesso
Data: 27/01Por: Roberto Zabeo
Em qualquer negócio, a qualquer tempo, em qualquer lugar duas noções estão sempre presentes: incerteza e risco.
Incerteza relaciona-se com mais de uma possibilidade para se determinar o resultado de uma decisão ou evento, com uma ponderação numérica correspondente. Risco é a incerteza definida através das possíveis consequências e impactos negativos de uma decisão ou evento, estimando-se (quantificando-se) a probabilidade de ocorrência de cada uma das possibilidades. Para quem se interessa em se aprofundar no assunto, recomendo o livro “How to Measure Anything” de Douglas W. Hubbard.
Possibilidades e probabilidades, portanto, tem tudo a ver com hipóteses, dimensionamento, amostragem, experimentação e medição. Sendo assim, incerteza e riscos, só podem ser determinados através do estudo e exercício desses fatores. No mundo real dos negócios, os famigerados “eu acho, eu estimo, eu avalio” - presentes em 99.9% das discussões sobre determinada situação ou problema – para ter substância, deveriam ser substituídos por “estou oferecendo as provas mínimas necessárias de que o que acho, estimo ou avalio, tem sustentação em fatos e números (não enviesados)”. Para isso é necessário colher evidências, testar e provar sempre. Em nossa vida profissional é melhor “estarmos aproximadamente e humildemente certos do que precisamente e enfaticamente equivocados”.
Quando avaliamos startups - invariavelmente todos os dias - para recomendar investimentos, dentre alguns fatores essenciais buscamos entender se o comando do negócio tem as noções e práticas necessárias para transformar a incerteza e os riscos em indicadores de acompanhamento e avaliação do negócio para que, através disso, possa dimensionar (e ampliar) suas chances de êxito. Notem que não estamos falando de KPIs gerais ou genéricos, mas sobre aqueles que realmente identificam os sinais vitais do negócio e que justificam atratividade para investir.
Curiosamente, na sua essência, um dos papéis mais importantes desempenhados por startups está em transformar incertezas e riscos, normalmente evitados por empresas estabelecidas, em oportunidades de sucesso, gerando inovação e agregando valor substancial à sociedade. Essa ocorrência depende, entretanto, em transformar intuição, ideias, paixão, energia e muito sacrifício em evidências fortes de que esse conjunto esteja (ou possa estar) produzindo alto retorno como compensação pelas incertezas e pelo risco para merecer atenção e interesse. Se não for por retorno substancial, qualquer investidor consideraria alocar seus recursos no conhecido, no previsível, no mais seguro, no menos confuso, menos especulativo, etc., do que num novo negócio emergente.
Como consequência, o que se espera é que a startup desenvolva para seu próprio benefício – afinal, não se faz isso apenas para os investidores – um “roteiro de viagem”, no qual os objetivos do negócio são desdobrados em indicadores que revelam suas diversas dimensões de sucesso. Essas dimensões, se medidas corretamente, evidenciam o progresso do empreendimento nas perspectivas essenciais do negócio, e.g., resultados financeiros (receitas, investimentos e custos) vendas e crescimento, níveis de satisfação dos clientes, qualidade e produtividade operacional e, de forma ótima, aprendizado e engajamento do time e dos parceiros-chave. Isso é muito mais que um Plano de Negócios, é na realidade, a demonstração do entendimento de como o negócio funciona e deve funcionar.
O mais importante desse roteiro é que ele finalmente determina o nível de alcance da ambição dos fundadores e dos principais stakeholders com relação ao sonho original na criação da empresa, o que é fundamental para identificar e situar as melhores trilhas e seguir (ou não) adiante.
Como metodologia, podemos sugerir que tudo começa com a definição de um propósito claro do porque e para que a empresa existe. Segue-se um bom desenho arquitetônico do negócio - o “Business Model Canvas” é a ferramenta sugerida para isso. Na sequência deve-se desenhar um roadmap estabelecendo o que é fundamental para que a empresa siga adiante, conectando numa perspectiva de tempo e investimento (com detalhes e alternativas) todas as atividades críticas, os conhecimentos, as competências, as parcerias, os eventos-chave (desenvolvimento, produção, entrega) de valor do negócio - nessa etapa é essencial aproveitar o conhecimento oferecido pela metodologia de Gestão de Projetos. Para estruturar a oferta e eventualmente criar o MVP, existe um método desenvolvido pelos mesmos autores do “Business Model Canvas” disponível no livro denominado “Value Proposition Design”. Daí em diante, os empreendedores têm que saber ouvir o que o ambiente está dizendo ou querendo dizer, escutar o que é relevante para o negócio, adequar, testar, ajustar, aprender, administrar e executar (isso é: fazer gestão!).
É compreensível que a paixão, entusiasmo e a energia inicial de um empreendedor apontem quase que exclusivamente para o nirvana de ver a ideia em funcionamento - não importando como -, de vendê-la para o mundo, de se ver cercado do melhor que a intenção inicial projetou. Quando executada apenas com um enorme coração, essa etapa faz com que iniciativas fiquem confusas e “encharcadas” de improvisação o que, muito provavelmente, resultará em desperdício e/ou caos.
Pior ainda é que paixão, entusiasmo e energia quando não devidamente calibrados pela realidade, projetam os resultados finais do novo negócio como a representação numérica de uma impossibilidade real, de um sonho. Apenas revelam, através de um bottom-line parcimonioso, a possibilidade (sem probabilidades) de existir um gigantesco volume de clientes, comprando ao preço máximo uma oferta produzida a um custo mínimo, ao final de alguns poucos anos de vida da startup. Se não fosse apenas perda de tempo, isso apresentado descaradamente, sem provas, e sem nenhum outro fundamento objetivo e convincente, também reflete a necessidade de melhoria do significado do que seja empreender profissionalmente, já que em situações como estas (infelizmente corriqueiras), nem vale a pena perguntar onde se esconde - e com quem fica - o famigerado e odiado risco?
A paixão, o entusiasmo e a energia inicial de um empreendedor - ao contrário do que possam parecer - deveriam ser seus focos de motivação principal para organizar, estruturar e colocar medidas de desempenho no negócio, criando sentido e dando-lhe direção. Apesar do grande volume trabalho que essa fase demanda, ela marcará o passo definitivo para minimizar as incertezas e mitigar os riscos das etapas e atividades críticas posteriores da operação, facilitando também a busca de recursos de qualquer natureza ao tornar transparente a forma de execução e realização de resultados.
Investidores profissionais observam, avaliam e valorizam startups (muitas vezes ainda não operando ou com resultados incipientes) muito mais através da ponderação das possibilidades e condições efetivas de executarem adequadamente uma dinâmica de atividades, do que através da apresentação (teatral e padronizada) de uma ideia brilhante sustentada por um Plano de Negócios com números bem polidos, mas potencialmente irreais. Investidores profissionais buscam muito mais indicadores de realização potencial de um bom negócio do que os que simulam resultados brilhantes, mas improváveis, de uma “extraordinária ideia”.
Sem que possibilidades e probabilidades fiquem explícitas através de indicadores que verdadeiramente sustentem a solidez da ideia e propósito originais do negócio e dos empreendedores, a coerência da proposta-de-valor e a dinâmica da execução requerida, a possibilidade e probabilidade de anjos aparecerem para startups escapam do campo do investimento financeiro e intelectual, tornando-se produto de pura religiosidade!