Tração: A Noção Central em Startups
Data: 07/03Por: Roberto Zabeo
As ideias sobre um novo negócios surgem de duas formas: inspiração (“acordei com a solução para grandes problemas... especialmente os meus”), que é o produto de intuição e pura criatividade, ou da observação e análise estruturada de determinado problema, ambiente ou situação para a proposição de soluções. Esses (inspiração e razão) são os dois lados da mesma moeda, portanto não vivem de forma independente e necessitam-se mutuamente para criar valor.
Em seguida aparecem dois enormes desafios à frente na decolagem de uma startup: (a) saber se a ideia é algo comercialmente aceitável (existe alguém interessado em comprar?), e sendo (b) saber transformar a ideia num negócio viável (com organização para a produção, entrega e crescimento). A intuição e criatividade quando bem demonstradas devem representar os intangíveis (o PORQUE) do negócio e a observação, análise e organização da solução (o QUE e o COMO) devem tangibilizar a realização. Essas são as condições básicas e necessárias para qualquer novo negócio.
Mas ainda há ainda um gigantesco obstáculo a superar que é a necessidade de recursos para que uma startup consiga sair da fase das ideias, dos modelos teóricos e da empolgação. Nenhum investidor profissional ficará emocionado apenas com eloquência, planilhas e PowerPoint. É fundamental que tudo isso se transforme em TRAÇÃO (TRACTION) que é a condição suficiente para que uma startup mereça sobreviver e prosperar.
Essa noção parece que vem da analogia proposta pela capacidade de se tirar um objeto ou veículo da imobilidade e vencer o atrito necessário entre sua superfície e a superfície sobre qual ele deve se mover. Em uma startup a TRAÇÃO deve demonstrar que a superfície das ideias, modelos e empolgação é capaz de se deslocar e vencer o arrasto e o atrito provocados pela rugosidade da superfície de determinada oportunidade de mercado e arena de negócios, transformando-se em RECEITA e CAIXA de forma rápida (de preferência muito rápida). Ah! E, normalmente, com poucos recursos iniciais disponíveis!
A TRAÇÃO deve representar vitalidade e crescimento que, em outras palavras, significa a motivação principal de algum investidor consciente em considerar um negócio atrativo o suficiente para nele colocar seu dinheiro e fazê-lo crescer ainda mais. Também estabelece qual é o ponto de inflexão entre o grande e crescente sacrifício do empreendedor versus a possibilidade de considerar alternativas para manifestar seu talento caso a TRAÇÃO não ocorra da forma esperada.
Naval Ravikant, fundador do AngelList, trata do assunto TRAÇÃO como: “É basicamente uma evidência quantitativa da demanda dos clientes. Dessa forma, se você estiver numa empresa de software dedicado [a tração inicial] pode ser representada pelos dois ou três clientes que já pagam um pouco. Se você estiver no negócio de software para consumidores a barra pode ser tão alta quanto uma centena de milhares de usuários... É a definição da Suprema Corte [dos Estados Unidos] para pornografia: Você sabe o que é quando você a vê.”
É lícito se indagar como conseguir TRAÇÃO nas fases iniciais de uma startup. A resposta vem de bate-pronto: qualquer negócio começa com a identificação precisa de um cliente e com sua aquisição, se sobre isso for adicionada a variável velocidade com que devem ocorrer aí se encontra o embrião de um negócio promissor. Sem isso, tudo mais é hipotético incluindo-se o endosso dos pais, parentes, professores, mentores, conselheiros, palpiteiros e amigos sobre a extraordinária ideia que motivou a enquete de opiniões e eventuais interesses.
Dificilmente alguém colocará dinheiro sobre uma imprecisão hipotética (às vezes os pais, parentes e alguns anjos - celestiais - pouco informados e bondosos podem fazê-lo).
Uma startup só pode ser assim considerada quando apresenta crescimento rápido, é o que afirma Paul Graham fundador da aceleradora Y Combinator. Se não tiver crescimento rápido perderá espaço para as que o apresentarem em menor tempo e com as maiores taxas.
Aos olhos de investidores atentos e com disponibilidade de aportar o que deverá sustentar as fases posteriores do negócio a equação definitiva para investir está baseada no quociente entre a mitigação de riscos e o retorno sobre o capital empregado numa perspectiva adequada de tempo, considerando-se as diversas alternativas disponíveis.
Alguém poderá sugerir outras formas de mitigar riscos e incertezas de retorno que não forem baseadas em TRAÇÃO adequada numa perspectiva de tempo que ofereça boa visibilidade e previsibilidade? Não são essas as bases de um valuation consciente? Portanto, quanto mais TRAÇÃO mais valerá o negócio!
Startups trazem consigo o glamour e a aventura dos melhores sonhos de independência e realização, mas infelizmente poucas (... muito poucas) atravessam a barreira do cinturão de asteroides de Andrômeda e retornam com vida. Empreender é muito mais um exercício de aceleração de neurônios do que de aquecimento de corações e quando os sucessos ocorrem eles procedem necessariamente do provar - através de TRAÇÃO - que um grupo significativo de clientes, consumidores e usuários reconhecem rapidamente valor real no negócio.
Fora disso, estamos falando de outras coisas e não de startups.